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Falta tratamento avançado para pacientes do SUS com câncer de mama metastático

31 de agosto de 2016

Mulheres diagnosticadas com câncer de mama avançado (HER2 positivo) poderiam ter dois anos a mais de vida se houvesse o acréscimo de apenas um medicamento específico (trastuzumabe) ao tratamento convenciona oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O dado, citado pelo oncologista Leandro Burst durante workshop sobre câncer de mama, realizado este mês em Gramado, Rio Grande do Sul, chama a atenção para a qualidade do tratamento oncológico público no Brasil, tema de estudo publicado recentemente por especialistas brasileiros no norte-americano Journal of Global Oncology, da Sociedade Americana de Oncologia Clínica.

Na sua palestra, Leandro Burst traçou paralelos aos tratamentos disponíveis nas redes pública e privada no País. “Enquanto terapias inovadoras indicadas para mulheres com câncer de mama avançado estão disponíveis para pacientes de saúde há 17 anos, o SUS continua oferecendo somente a quimioterapia para os casos metastáticos. Somente a partir de 2013, o trastuzumabe passou a ser disponibilizado na rede pública e apenas para casos de câncer de mama inicial”, alertou o oncologista, no evento promovido pelo laboratório Novartis.

Com um percentual tão alto de atendimento pela rede pública, as projeções para os próximos anos são alarmantes. Um estudo feito pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) aponta que, somente neste ano, 57,9 mil novos casos de câncer de mama devem ser registrados no País. “As estimativas do Inca permitem prever que 2.008 mulheres serão diagnosticadas com câncer de mama metastático (avançado). Se elas forem tratadas somente com o que é oferecido pelo SUS (quimioterapia), nós teremos apenas 808 pacientes vivas nos próximos dois anos. Se elas recebessem a combinação de quimioterapia e trastuzumabe, o número de sobreviventes pularia de 808 para 1.408 mulheres”, disse o médico.

Leandro Burst ressaltou que há um enorme abismo entre as terapias (e diagnósticos) de quem tem convênio e de quem não tem. “O saldo disso é que teremos (em dois anos) 768 mortes prematuras tratadas pelo SUS e que poderiam ser evitadas. Esse medicamento (trastuzumabe) é oferecido pelos planos de saúde há mais de 15 anos”, resumiu, retomando o estudo feito pelo Inca.

“Nós, oncologistas que atendemos na rede pública, passamos quase que diariamente por um dilema. Você está na frente de uma paciente e sabe que existem alternativas terapêuticas que podem oferecer um ganho ou qualidade de vida. Como você vai dizer que ela não tem direito ao que há de melhor? Essa é uma questão grave e que precisa ser amplamente discutida com a sociedade”, desabafou Leandro.

 

Agravantes

Além da falta de acesso ao trastuzumab, incluído há 15 anos na lista de medicamentos prioritários da Organização Mundial da Saúde (OMS), outros fatores que reduzem as chances de cura das pacientes são o sucateamento dos equipamentos da rede pública e a defasagem na tabela de pagamento para os procedimentos (Apac).

“É difícil detectar precocemente o câncer no SUS. Há demora na realização de exames e muitos dos equipamentos (mamógrafos) estão descalibrados”, relatou Leandro Burst. Segundo dados do Inca, 50% dos tumores de mama são diagnosticados em estágios mais avançados, e 30% deles irão evoluir para o estágio em que ocorrem as metástases. “A doença metastática está intimamente relacionada a um diagnóstico tardio”, informou.

O oncologista ressaltou, também, que a tabela do SUS é raramente reajustada. “Estamos há 12 anos sem uma revisão nos valores pagos pelos procedimentos. Houve uma mudança algum tempo atrás, mas foi apenas uma redistribuição. Não há novas incorporações”, disse.

A Autorização para Procedimento de Alta Complexidade (Apac) é uma tabela nacional que paga por patologia, conforme o estágio da doença. Tem um valor mensal fixo, que deveria cobrir todos os custos do tratamento do paciente (desde internação, medicamentos, alimentação, luz, etc.).

Leandro Burst finalizou a palestra com algumas reflexões: “Precisamos rever nossos conceitos acerca de qual o valor de uma vida. Quanto vale a vida de quem tem chance de cura? Ou, quanto vale a vida de quem não tem chance de cura, mas pode viver mais com tratamentos eficazes?”, indagou o oncologista.

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